ed. 24 - matéria doutrinária

Guilherme Steagall  


Lei da Conservação

O mundo moderno constantemente nos remete a questões conflitantes, tais como: é lícito cuidar de meu corpo? Quanto devemos trabalhar? Qual o patrimônio a acumular? Quanto é suficiente para viver e será que vai faltar? Devo me dedicar aos outros em detrimento de mim mesmo? Será o luxo ruim? E tantas outras.
A doutrina espírita vem nos esclarecer esses questionamentos, através do Livro dos Espíritos em sua terceira parte – Das Leis Morais, sobre a Lei de Conservação, em suas questões 702 a 727. São tratados vários aspectos da lei:
Instinto de conservação – é uma lei da natureza e todos o possuem, porque Deus nos deu a necessidade de viver para que nos aperfeiçoemos.
Meios de conservação – Deus sempre nos disponibiliza o necessário para a sobrevivência através da terra e de seus derivados (basicamente tudo o que é produzido). A questão é saber o que é necessário (e não supérfluo) e não esperar passivamente que nos seja entregue este necessário, mas, sim, que busquemos ativa e arduamente aquilo que necessitamos. É verdade que o aumento no grau de civilização multiplica, de forma geral, as necessidades, mas também multiplica as fontes de trabalho e os meios para viver – ver exemplo da melhora da higiene pública. “Para todos há lugar ao sol, com a condição de que cada um ocupe o seu e não o de outrem”. No caso excepcional em que a prova seja a de privação, cabe ao homem, tendo esgotadas as alternativas que sua inteligência oferece para buscar o seu sustento, aceitar sem murmurar o caminho proposto. Por isso mesmo o sacrifício de um semelhante para buscar saciar a sua fome é considerado um duplo crime – contra a natureza e contra o próximo. 
Gozos dos bens terrenos – o direito de usar bens terrenos é consequência direta da necessidade de viver. Ainda mais os atrativos associados ao gozo dos bens terrenos são incentivos colocados pela natureza para que o homem não se torne indiferente à vida e possa: 1. Cumprir sua missão na terra; 2. Ser exposto à tentação, que visa desenvolver a razão e assim preservá-lo dos excessos. O homem que vive em busca de excessos coloca-se abaixo do bruto, porque até o bruto se detém ao ter suas necessidades satisfeitas. Da mesma forma, quem vive em busca de excessos abdica da razão que Deus lhe deu e encara consequências importantes de seu desregramento, como doenças e morte do corpo físico, entre outras.
Necessário e supérfluo – o homem ponderado conhece o limite do necessário por intuição, mas infelizmente muitos só chegam a conhecê-lo por experiência e muitas vezes à sua própria custa. O supérfluo é comumente associado aos vícios, que alteram a constituição do homem e lhe criam necessidades que não são reais. Ainda quando para a satisfação do supérfluo o homem desperdiçar recursos que faça falta a outros, será responsabilizado pelas privações causadas. É importante frisar que os limites entre necessário e supérfluo não são absolutos – a razão deve sempre prevalecer. 
Privações voluntárias e mortificações – é obrigação do homem prover as necessidades de seu próprio corpo, porque sem força e sem saúde a vida não é possível – e ela é necessária para nossa evolução, como vimos acima. Assim, privações voluntárias não tem mérito – fazer bem ao nosso próximo sim. Mortificações ascéticas são atos de egoísmo, porque essencialmente visam o bem próprio e não o de outros. Ainda no que tange à privação, vemos que o alimento animal ainda é necessário tendo em vista a constituição física do ser humano, a sua privação só é meritória quando beneficie outrem, posto que a Deus não possa agradar nada que não tenha uma utilidade. Assim, os sofrimentos naturais são os únicos que elevam, mas nos é legítimo buscar proteção de perigos e sofrimentos – pelo próprio instinto de conservação; é possível perceber, neste aspecto, o equilíbrio que está presente em toda a Criação. Conforme a resposta da questão LE 727: “Contra os perigos e os sofrimentos é que o instinto de conservação foi dado a todos os seres. Fustigai o vosso espírito e não o vosso corpo, mortificai o vosso orgulho, sufocai o vosso egoísmo, que se assemelha a uma serpente a vos roer o coração, e fareis muito mais pelo vosso adiantamento do que infligindo-vos rigores que já não são deste século”. 
Os princípios mais importantes dentro da Lei de Conservação são a consideração constante do que vai ser decidido à luz de duas ideias básicas: ser necessário e ser útil. Consultando o nosso íntimo, em preces e abrindo nossa intuição para que os nossos amigos espirituais possam nos orientar, devemos buscar as respostas a cada uma das questões que nos movimenta o dia a dia dentro destes dois parâmetros. Esta necessidade é real ou foi criada por mim mesmo? Eu preciso deste bem? Isto o que estou fazendo poderia ser em detrimento da necessidade de outros? Isto pode mesmo ter utilidade, inclusive para os outros? Posso fazer a mesma coisa com maior utilidade? Para todos estes tópicos, lembremos de um alvo exemplo: Francisco de Assis. Sempre vivendo com o absolutamente necessário, sem deixar de cuidar daquilo que Deus lhe deu, seu próprio corpo, e tornando cada momento de sua vida de uma grande utilidade – para os outros.


Índice

Nenhum comentário:

Postar um comentário